sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Não queremos esta política para o cinema

O Cinema Português - aquilo que se constituiu como actividade artística, ao arrepio das lógicas e das práticas de massificação embrutecedora - tem-se revelado um dos mais belos frutos da energia que, desde as importantes convulsões históricas em torno de Abril de 1974, impele todos quantos nele se envolvem (realizadores, actores, técnicos, espectadores...) a mexer na vida e no mundo. Basta atentar na maneira como os objectos artísticos que decorrem desse cinema singular interpelaram e continuam a interpelar quem, dentro e fora do país, os descobre e com eles dialoga.
Nós, realizadores, envolvidos a diversos títulos, nos olhares, nos modos de fazer e nas práticas de pensamento, que caracterizam o cinema que defendemos, queremos tornar claro que :
- Rejeitamos todas as manobras de gabinete que visam destruir, em lugar de alargar e aperfeiçoar, as estruturas de apoio ao cinema enquanto actividade artística.
- Recusamos a política - iniciada em 2002 - que tem levado o Instituto de Cinema, ao longo de sete anos, a um progressivo esvaziamento das suas funções: diminuição drástica de filmes apoiados, portas cada vez mais fechadas a novos realizadores e a projectos mais experimentais, falta de transparência dos júris, redução de tudo o que é essencial para o desenvolvimento de um cinema vivo e independente.
- Indignamo-nos contra todas as formas de capitulação ou cumplicidade dos responsáveis que — sob a pressão de agentes do mercado empenhados em reduzir o cinema a uma actividade puramente comercial e a coberto de escandalosas mentiras — visam transformar o frágil sistema de apoios financeiros à criação cinematográfica em linhas de crédito a fundo perdido para alimentar produtores sem escrúpulos e realizadores sem projecto artístico.
- Tudo faremos para impedir que os escassos meios de que o estado dispõe para promover a actividade de criação cinematográfica sejam desbaratados na produção de «conteúdos » boçais: a existência deles só deveria depender das receitas que as regras do mercado lhe concedessem. É inadmissível que sejam meios financeiros dependentes do Estado que os sustentem.
- Queremos um Instituto de Cinema, que apoie e redinamize o Cinema, que o defenda e que seja capaz de reestabelecer o diálogo - e não um simulacro de diálogo - com os realizadores, os seus principais responsáveis.
- Faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para denunciar todas as tentativas de aniquilação do nosso cinema enquanto memória viva e instrumento para pensar os passados e os futuros de Portugal.
APR- Associação Portuguesa de Realizadores
texto aprovado na Assembleia Geral da APR do 12 de Fevereiro 2009