quarta-feira, 7 de julho de 2010

É a cultura, estúpido! por Daniel Oliveira

É a cultura, estúpido! por Daniel Oliveira (excertos)
(texto completo aqui e aqui)

É quase patético o que o Estado português gasta em cultura. Chega por isso a ser insultuoso que se insista em falar em subsidiodependência quando todo o dinheiro do Estado que nela é investido não daria para uma obra pública que se visse.

Poderá parecer normal a notícia de que os apoios às actividades culturais vão sofrer um corte de 10% graças à cativação geral de 20% do orçamento do Ministério da Cultura, aquele que de longe menos gasta aos contribuintes (e o pouco que recebe gasta consigo próprio) e que tem, em termos relativos, dos orçamentos mais baixos da Europa.

Para uma actividade que vive no limite da sobrevivência (e que já é largamente financiada pelos próprios criadores), 10% é o golpe de misericórdia. Sobretudo se tivermos em conta que, depois de dez anos de cortes sucessivos nos já magros apoios, esta é uma área onde a austeridade não começou agora.
(...)
Não deveria ter de escrever que um País sem cultura nem criadores não é bem um País. Mas vou para outro argumento que talvez, neste tempo, pegue melhor: a cultura e o entretenimento são uma das áreas de maior crescimento em todo o Mundo. Segundo o “Creative Economy Report 2008″ das Nações Unidas, o sector cultural e criativo representava, em 2005, 3,4% do comércio mundial.

Mais recentemente, Augusto Mateus coordenou um estudo onde se concluía que o sector cultural e criativo representava 2,8% da riqueza gerada em Portugal (3,691 milhões de euros) e que dava emprego a 126 mil pessoas. (...) O combustível desta gigantesca indústria são as actividades culturais nucleares. Sem elas, o motor pára. Não perceber isto é o mesmo que achar que é possível ter uma indústria de ponta sem investir em educação.
(...)
A ideia de que num pais da dimensão de Portugal a cultura pode depender exclusivamente do mercado é absurda. Nunca assim foi, nunca assim será. Mesmo potências culturais como a França ou a Alemanha, com mercados internos bem maiores do que o português, investem muito dinheiro público no apoio à produção cultural. E consideram esse investimento uma prioridade. Ele não é um favor a ninguém.
(...)
E só o facto de me ter visto obrigado a dar argumentos económicos para defender o apoio público à cultura diz muito do estado a que já chegámos.