Há quatro anos e meio, a 31 de Dezembro de 2005, a Lusomundo/PT/Zon adquiriu, com intermediação conivente do Estado português, um catálogo de 90 filmes portugueses na posse comercial do produtor Paulo Branco, em nome do saneamento financeiro das suas casas de produção arruinadas.
Nesse negócio foram também levados 27 filmes do património da Tobis Portuguesa, que o dito produtor também comercializava.
A partir desse momento, com os 45 filmes de que já era proprietária (adquiridos pelo Coronel Luis Silva, anterior dono da Lusomundo) tornou-se esta Lusomundo/PT/Zon, com esta centena e meia de filmes, dona e senhora do essencial do património do cinema português, antigo e contemporâneo.
E a partir desse dia entrou em cena o ‘abafador’ (que Manoel de Oliveira refere no seu artigo publicado neste jornal [o Público] na passada sexta-feira, 18). Os filmes que tinham sido comprados por uns milhões de euros, e que toda a gente pensava que iriam ser cada vez mais vistos, mostrados, vendidos, comercializados (quanto mais não fosse, para rentabilizar esse investimento, precisamente), pura e simplesmente desapareceram de circulação.
Os filmes deixaram de ser vistos, mostrados, promovidos, vendidos. Os filmes foram enterrados. E quem quer que fosse que o tentasse fazer, em Portugal ou no estrangeiro - ver os filmes, comprar os filmes, promover os filmes, vender os filmes -, teve sempre a mesma resposta: nenhuma resposta.
Durante anos e anos estes filmes foram mostrados nos mais importantes festivais de cinema do mundo, estreados em Portugal e noutros países, editados em DVD aos milhares, integrados em retrospectivas e homenagens um pouco por todo o mundo, passados nas televisões.
Há quatro anos e meio entrou em cena o ‘abafador’ e, com o seu travesseiro, começou a matar os filmes.
São 90 filmes de realizadores como Manoel de Oliveira, João César Monteiro, José Álvaro Morais, Fernando Lopes, João Botelho, Pedro Costa, João Canijo, Teresa Villaverde, José Fonseca e Costa, Luis Filipe Rocha, etc, etc, num total de 27 cineastas*.
São filmes que, desde então, pura e simplesmente estão a ser escondidos, afastados do público, abafados. Não apenas nada é feito para os mostrar e promover e vender, como há mesmo uma acção consciente de tudo fazer para o impedir. E ninguém presta contas, responde aos contactos, fala com os realizadores. Nada.
E sucessivos ministros e responsáveis políticos da Cultura (um dos quais com ligações comerciais a esta empresa), apesar de plenamente conscientes do que se passava e passa, nada fizeram (apesar também da famosa golden-share do Estado). Tal como a Direcção do Instituto de Cinema e Audiovisual, sempre a par do que se estava a passar, alguma vez fez fosse o que fosse para denunciar a prepotência e os atropelos desta Lusomundo/PT/Zon ao cinema português.
Quem é então esta Lusomundo/PT/Zon - perguntar-se-á - para fazer o que anda a fazer?
A resposta é longa, porque muitos e diferentes são os tentáculos deste abafador.
É a Lusomundo/PT/Zon que controla mais de 50% dos cinemas em Portugal e que é sempre tão generosa com os filmes americanos e o cinema pimba português, a quem prodigaliza sempre o melhor tratamento.
É a Lusomundo/PT/Zon que controla mais de 50% da distribuição de cinema em Portugal, agente e representante dos grandes estúdios americanos a quem serve diligentemente os interesses.
É a Lusomundo/PT/Zon que controla a TVCabo, e em particular os canais de cinema TVCine, monopolizados pelo mau cinema americano e onde recusa sistematicamente os filmes dos outros distribuidores, de forma a liquidar essas empresas de distribuição independente.
É a Lusomundo/PT/Zon que controla o FICA e as suas decisões (o Fundo de Investimento no Cinema) - apesar de ter nele uma participação de apenas 30% -, e onde inventa e promove produtores ‘patos-bravos’ e que quer à força impor um cinema pimba português.
É, finalmente, a Lusomundo/PT/Zon que destrói os filmes portugueses que adquiriu, cuja única habilitação é de servir o mau cinema americano no nosso país; que dá cabo dos distribuidores independentes; que uniformiza o cinema que se pode ver e limita a liberdade de escolha dos espectadores; que põe e dispõe dos dinheiros públicos do FICA ao serviço dos delinquentes e do cinema pimba.
É este o ‘abafador’, e o abafador tem um nome, o seu administrador todo-poderoso, senhor Antunes João, que nos últimos quatro anos tem sido o instrumento directo da destruição do cinema português e do cinema em Portugal.
É esta empresa, é este abafador, que o Estado português tem que responsabilizar.
E é sobre ele e a Administração do grupo ZON que a senhora Ministra da Cultura tem que actuar.
Os filmes portugueses têm que ser vistos, a Lusomundo/PT/Zon não pode continuar impunemente a dar cabo do cinema português, dos filmes portugueses que comprou, dos distribuidores e dos produtores independentes.
* os cineastas são, por ordem alfabética - António Ferreira, Catarina Ruivo, Claúdia Tomaz, Edgar Pêra, Eduardo Guedes, Fernando Lopes, Ivo Ferreira, João Botelho, João Canijo, João César Monteiro, João Guerra, João Mário Grilo, Joaquim Pinto, Jorge Silva Melo, José Álvaro Morais, José Fonseca e Costa, José Nascimento, Luís Filipe Rocha, Manoel de Oliveira, Marco Martins, Mário Barroso, Pedro Costa, Raquel Freire, Rita Azevedo Gomes, Rosa Coutinho Cabral, Teresa Villaverde, Vicente Jorge Silva.
assinam este texto: Cláudia Tomaz, Edgar Pêra, Fernando Lopes, João Botelho, João Canijo, João Guerra, João Mário Grilo, Jorge Silva Melo, Manoel de Oliveira, Pedro Costa, Rita Azevedo Gomes, Rosa Coutinho Cabral, Teresa Villaverde, Vicente Jorge Silva, Margarida Gil e João Pedro Monteiro Gil, por João César Monteiro
texto publicado no "Espaço Público" da edição imprensa do jornal Público na quinta-feira 24 de Junho de 2010
Nesse negócio foram também levados 27 filmes do património da Tobis Portuguesa, que o dito produtor também comercializava.
A partir desse momento, com os 45 filmes de que já era proprietária (adquiridos pelo Coronel Luis Silva, anterior dono da Lusomundo) tornou-se esta Lusomundo/PT/Zon, com esta centena e meia de filmes, dona e senhora do essencial do património do cinema português, antigo e contemporâneo.
E a partir desse dia entrou em cena o ‘abafador’ (que Manoel de Oliveira refere no seu artigo publicado neste jornal [o Público] na passada sexta-feira, 18). Os filmes que tinham sido comprados por uns milhões de euros, e que toda a gente pensava que iriam ser cada vez mais vistos, mostrados, vendidos, comercializados (quanto mais não fosse, para rentabilizar esse investimento, precisamente), pura e simplesmente desapareceram de circulação.
Os filmes deixaram de ser vistos, mostrados, promovidos, vendidos. Os filmes foram enterrados. E quem quer que fosse que o tentasse fazer, em Portugal ou no estrangeiro - ver os filmes, comprar os filmes, promover os filmes, vender os filmes -, teve sempre a mesma resposta: nenhuma resposta.
Durante anos e anos estes filmes foram mostrados nos mais importantes festivais de cinema do mundo, estreados em Portugal e noutros países, editados em DVD aos milhares, integrados em retrospectivas e homenagens um pouco por todo o mundo, passados nas televisões.
Há quatro anos e meio entrou em cena o ‘abafador’ e, com o seu travesseiro, começou a matar os filmes.
São 90 filmes de realizadores como Manoel de Oliveira, João César Monteiro, José Álvaro Morais, Fernando Lopes, João Botelho, Pedro Costa, João Canijo, Teresa Villaverde, José Fonseca e Costa, Luis Filipe Rocha, etc, etc, num total de 27 cineastas*.
São filmes que, desde então, pura e simplesmente estão a ser escondidos, afastados do público, abafados. Não apenas nada é feito para os mostrar e promover e vender, como há mesmo uma acção consciente de tudo fazer para o impedir. E ninguém presta contas, responde aos contactos, fala com os realizadores. Nada.
E sucessivos ministros e responsáveis políticos da Cultura (um dos quais com ligações comerciais a esta empresa), apesar de plenamente conscientes do que se passava e passa, nada fizeram (apesar também da famosa golden-share do Estado). Tal como a Direcção do Instituto de Cinema e Audiovisual, sempre a par do que se estava a passar, alguma vez fez fosse o que fosse para denunciar a prepotência e os atropelos desta Lusomundo/PT/Zon ao cinema português.
Quem é então esta Lusomundo/PT/Zon - perguntar-se-á - para fazer o que anda a fazer?
A resposta é longa, porque muitos e diferentes são os tentáculos deste abafador.
É a Lusomundo/PT/Zon que controla mais de 50% dos cinemas em Portugal e que é sempre tão generosa com os filmes americanos e o cinema pimba português, a quem prodigaliza sempre o melhor tratamento.
É a Lusomundo/PT/Zon que controla mais de 50% da distribuição de cinema em Portugal, agente e representante dos grandes estúdios americanos a quem serve diligentemente os interesses.
É a Lusomundo/PT/Zon que controla a TVCabo, e em particular os canais de cinema TVCine, monopolizados pelo mau cinema americano e onde recusa sistematicamente os filmes dos outros distribuidores, de forma a liquidar essas empresas de distribuição independente.
É a Lusomundo/PT/Zon que controla o FICA e as suas decisões (o Fundo de Investimento no Cinema) - apesar de ter nele uma participação de apenas 30% -, e onde inventa e promove produtores ‘patos-bravos’ e que quer à força impor um cinema pimba português.
É, finalmente, a Lusomundo/PT/Zon que destrói os filmes portugueses que adquiriu, cuja única habilitação é de servir o mau cinema americano no nosso país; que dá cabo dos distribuidores independentes; que uniformiza o cinema que se pode ver e limita a liberdade de escolha dos espectadores; que põe e dispõe dos dinheiros públicos do FICA ao serviço dos delinquentes e do cinema pimba.
É este o ‘abafador’, e o abafador tem um nome, o seu administrador todo-poderoso, senhor Antunes João, que nos últimos quatro anos tem sido o instrumento directo da destruição do cinema português e do cinema em Portugal.
É esta empresa, é este abafador, que o Estado português tem que responsabilizar.
E é sobre ele e a Administração do grupo ZON que a senhora Ministra da Cultura tem que actuar.
Os filmes portugueses têm que ser vistos, a Lusomundo/PT/Zon não pode continuar impunemente a dar cabo do cinema português, dos filmes portugueses que comprou, dos distribuidores e dos produtores independentes.
* os cineastas são, por ordem alfabética - António Ferreira, Catarina Ruivo, Claúdia Tomaz, Edgar Pêra, Eduardo Guedes, Fernando Lopes, Ivo Ferreira, João Botelho, João Canijo, João César Monteiro, João Guerra, João Mário Grilo, Joaquim Pinto, Jorge Silva Melo, José Álvaro Morais, José Fonseca e Costa, José Nascimento, Luís Filipe Rocha, Manoel de Oliveira, Marco Martins, Mário Barroso, Pedro Costa, Raquel Freire, Rita Azevedo Gomes, Rosa Coutinho Cabral, Teresa Villaverde, Vicente Jorge Silva.
assinam este texto: Cláudia Tomaz, Edgar Pêra, Fernando Lopes, João Botelho, João Canijo, João Guerra, João Mário Grilo, Jorge Silva Melo, Manoel de Oliveira, Pedro Costa, Rita Azevedo Gomes, Rosa Coutinho Cabral, Teresa Villaverde, Vicente Jorge Silva, Margarida Gil e João Pedro Monteiro Gil, por João César Monteiro
texto publicado no "Espaço Público" da edição imprensa do jornal Público na quinta-feira 24 de Junho de 2010